quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Coração de Papel..




Em algum lugar do tempo..
Aquele, em que eu ainda tinha um coração.


Ah! Naquele tempo sim, saberia descrever essa emoção.
Naquela época descobri sua melodia e meu peito se abria pra mais uma canção
A cada novo dia, o meu corpo se enchia da mais pura paixão.

Ah! Coração..
Como batia rápido e acelerado, pelos simples fato de estar ao seu lado.
Segurava a sua mão e sentia bater na face, o vento gelado.

Ah! Dias de outono..
As flores caídas, jogadas, esquecidas.. já não tinham mais dono
Mas você, amado meu, no meu castelo ocupava o trono!

Ah! Que lindos olhos você tinha..
Brilhavam ainda mais quando você sorria.
E foi aí, eu já sabia..
Para sempre e para ti, eu me perdia!

Ah! Que ousadia..
No dicionário do meu peito, não cabia a covardia.
Só sabia descrever o amor imenso
que por ti,
apaixonado, sentia .

Ah! Se eu pudesse voltasse atrás..
Naquele tempo.
Naqueles dias..

Descobri que se tratando de amores,
nem tudo serão flores.
Ah! Fosse um dia de verão então,
não lhe entregaria meu coração!

Ah! Dias de inverno..
Apodreceram-se as flores caídas e já de partida,
você se foi.
Esqueceu de levar o tempo
que passa arrastado, cada vez mais lento.
Ficaram as lembranças.
Levou a esperança
Ficou você.


Ficou alguém que tornou-se o meu mais amargo tormento.
Rasgou as fotos
Ficaram os momentos.
Em mim..

Sofro desde então
pra ignorar nossa canção.
Esquecer teu riso doce
e recuperar meu coração.

Nessa velha folha amarelada, ao som de lágrimas,
deixo cravadas, esculpidas e tatuadas
as palavras de adeus.

Você levou a alegria,
e é covardia esse gosto de fél.
O pior é saber que,
aqui, no meu peito,
ainda desmancha por ti..
Um coração de papel.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Trancado..




Estava ali, na sacada de sua cobertura, em frente ao mar. Segurava um copo de whisky e, com a ajuda do dedo, girava as duas pedras de gelo, que ali estavam há algum tempo. Curvou-se, de maneira que, seus cotovelos ficassem apoiados na grade de proteção e apoiou seu queixo, o segurando com a mão.
Desviou seus olhos do copo e pôs-se a observar o lugar à sua volta. A vista lá de cima era linda.
O vento fazia com que a brisa do mar chegasse até seu rosto, espalhando a sensação de frescor e suavidade, um contraste perfeito com a noite quente e seca que despontava naquele início de semana.
O dia fora cansativo. Resolveu alguns problemas no trabalho, deixou o dobro acumulado. O trânsito estava um caos. A geladeira começava a ficar vazia. A cabeça dava sinais claros de que iria doer. Os pés latejavam, os calos estavam evidentes.
Nada. Nenhum pensamento anterior desviou sua atenção do casal que passeava feliz e de mãos dadas pela areia. A leveza com que eles corriam juntos. Se olhavam. Tocavam carinhosamente e pareciam não mais querer se largar. Pareciam não ter cansaço, problemas no trabalho ou dor de cabeça. Beijavam-se como se o mundo fosse a língua que percorria avidamente dentro da boca. Explorando. Sugando. Marcando.
E por alguns, poucos, instantes se deixou perder naquela cena. Sua mente, numa tentativa insana, cogitou a possibilidade daquele sentimento realmente existir.
Balançou a cabeça, riu com sarcasmo e se perguntou mentalmente, se já não havia bebido demais.
Decidiu sair da sacada e voltar para o sofá, confortavelmente disposto no centro da sala, e assistir algum programa qualquer na TV. Só queria, e precisava, relaxar.
Teve os passos interrompidos pelo som da campainha que não parava de tocar. Praguejou e proferiu alguns palavrões inaudíveis, tomou a bebida que ainda restava no copo, o largou com força na mesa, e contrariando toda sua vontade, foi até a porta. Sem olhar no olho mágico, a abriu. Assustou-se.

– Você? – disse com a voz trêmula
– Eu disse que viria, qual o motivo da surpresa?
– E eu disse que não queria mais você. Qual o motivo da insistência?
– Me deixa entrar? – pediu suplicante
– Jamais. Vai embora! – Afirmou confiante
– Não adianta me expulsar, rejeitar. Não vou desistir de você.
– O problema é seu. Vou fechar a porta e você que se vire aí de fora! – Ameaçou um sorriso confiante
– Vou ficar aqui, batendo e gritando seu nome, até você abri-la novamente.
– Eu não entendo. Por que eu? Com tantas pessoas. Por que justo eu? – Deixou que um suspiro cansado escapasse
– Me deixa entrar, a gente conversa melhor, com calma. Uma trégua. Aceita?

Nada disse. Apenas deixou espaço suficiente para que entrasse. Acomodaram-se no sofá e se olharam por longos minutos.

– Você precisa acreditar em mim!
– Não consigo. – Colocou a mão na cabeça e bagunçou os cabelos, em um claro sinal de nervosismo.
– E por que?
– Você é intenso, generoso, grudento demais. Me transformou, me fez sentir coisas indescritíveis e depois, mágico como surgiu, se foi.
– Eu não fiz por mal. Era imaturo, inconseqüente, passageiro demais.
– Não quero mais me sentir tão vulnerável e sua presença é a receita para que ela cresça. Vá embora!
– Mas eu acabei de chegar. Aliás, ainda estou esperando outro alguém.
– O que? Do que você está falando? Quem está para chegar? – Perguntou sem entender.

A campainha tocou novamente, interrompendo o assunto e deixando a pergunta se dissolver no ar. Sem resposta.

Percebendo que, mais uma vez, sua vontade fora inteiramente contrariada, se viu obrigada a atender a campainha, que dessa vez tocava ainda mais apressada e estridente. Como que anunciando um palpitar conhecido e presente. Abriu a porta. Se encantou.
Se perdeu na imensidão cor de mel que se oferecia em um olhar cintilante. Não soube o que falar ou onde colocar as mãos. O silêncio foi quebrado..

– Oi! Eu acabei de me mudar para o apartamento ao lado e queria.. É..queria saber se você tem um pouco de açúcar para me emprestar. Eu sei que é meio estranho vir pedir açúcar justo no primeiro dia, mas.. – Nem conseguira ouvir o resto da frase. Sem pensar. Sem controlar as batidas do seu coração, apenas disse:
– Entra..!

Enquanto pegava uma xícara de açúcar, sua visita anterior, que ainda se encontrava por ali, abriu as janelas e deixou que a brisa fresca do mar entrasse. Voltou a se posicionar ao lado da anfitriã e sem que ela percebesse, sussurrou ao seu ouvido:

– Quem chegou foi a materialização do meu eu. O sorriso bobo. O acelerar do coração. Arrepios e tremor. Sou eu, o amor. E aquela pessoa distraída que acabara de esquecer o açúcar, a consolidação! Do amor. Do seu amor..

A solidão saiu do quarto, acompanhada da tristeza e melancolia. Saiu daquele apartamento e já do lado de fora, ao som de gargalhadas e vozes satisfeitas, sussurrou contrariada:

Ah, amor. Se você soubesse por quantos anos essa porta permaneceu trancada..